domingo, 22 de julho de 2012

A arte de ser feliz



Houve um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que parecia 
ser feita de giz.
 Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco. 


Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. 

Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde, e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas.
 



Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse.


E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz. 


Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. 


Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. 


Ás vezes, um  galo canta. Às vezes, um avião passa.


Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. 


E eu me sinto completamente feliz. 


Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de 
cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem
diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a
olhar, para poder vê-las assim.



                              Cecília Meireles




Um comentário:

  1. Que ecanto ler esse texto, recheado de doçura...nos leva ao pleno encontro da felicidade... Cecilia, sempre envolvente em suas palavras!


    Bjussss flor!

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